Raquel Nassif

STF adia julgamento de correção do FGTS

Por Raquel Nassif

Fonte: Correio Braziliense


Decisão foi tomada depois de reunião do presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e outros integrantes do governo, que teme rombo de R$ 8,6 bilhões e encarecimento do crédito habitacional.

Depois de se reunir com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e outros integrantes do governo, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, decidiu ontem à noite retirar de pauta o processo que discute a correção monetária do FGTS. A análise será reagendada para 8 de novembro.

O julgamento seria retomado nesta quarta-feira. A ação preocupa o governo, que estima impacto de R$ 8,6 bilhões em quatro anos caso prevaleça a tese apresentada por Barroso, além do encarecimento do crédito habitacional para a população de baixa renda. Ao votar em abril, o ministro do STF argumentou que a atualização dos valores não deve ser menor que a aplicada à da caderneta de poupança. O posicionamento de Barroso também desagradou os cotistas do Fundo, que esperavam o pagamento retroativo dos valores atualizados. Para o ministro, contudo, o resultado do julgamento deve valer apenas para o futuro.

Barroso, além de presidente do Supremo, é relator da ação. Atualmente, o FGTS é corrigido pela Taxa Referencial (TR) acrescida de 3%. O partido Solidariedade, autor do processo, argumenta que, desde 1999, esse índice não é suficiente para repor o poder aquisitivo dos trabalhadores. Por isso, a legenda pede que a TR seja substituída por um indicador ligado à inflação, como o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

De acordo com nota divulgada pelo STF, o ministro “reiterou a posição de que considera os pontos importantes, mas que vê como injusto o financiamento habitacional ser feito por via da remuneração do FGTS do trabalhador abaixo dos índices da caderneta de poupança”. A nota também diz que as partes concordaram em conversar novamente para buscar uma solução que “compatibilize os interesses em jogo”.

Também participaram da reunião os ministros do Trabalho, Luiz Marinho, e das Cidades, Jader Filho, o advogado-geral da União, Jorge Messias, a presidente da Caixa, Rita Serrano, e a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Lenzi Ruas de Almeida.

Tema sensível

Até o julgamento ser suspenso em abril, apenas Barroso e o ministro do STF André Mendonça tinham votado. O placar está em dois a zero para que a correção dos valores do fundo seja no mínimo igual à da poupança.

Segundo a advogada Raquel Nassif, especialista em processo do trabalho no Autuori Burmann Sociedade de Advogados, o tema é sensível porque, se for vitoriosa, a ação pode implicar a aplicação de um índice de correção mais oneroso para o crédito habitacional. “Hoje, se aplica a TR e a pretensão é que se utilize um índice mais rentável, que se iguale, ao menos, à poupança, o que seria mais justo com o trabalhador. Mas a atualização do FGTS pode trazer consequências na obtenção de crédito imobiliário”, afirmou.

O rombo de R$ 8,6 bilhões estimado pelo governo considera a aplicação da regra do INPC até 2028. Mas, a conta pode ser muito maior, caso seja aprovado o pagamento retroativo dos cotistas. Uma simulação feia pelo Instituto Fundo de Garantia concluiu que o valor a ser reposto poderia chegara a R$ 720 bilhões caso o INPC fosse aplicado a todas as contas do FGTS desde 1999, data tomada como base na ação do Solidariedade. O entendimento do ministro Luís Roberto Barroso, no entanto, é que essa questão cabe ao Legislativo. “A questão da ocorrência de perdas passadas somente poderá ser avaliada e equacionada por via legislativa e/ou mediante negociação entre entidades de trabalhadores e o Poder Executivo”, declarou Barroso em seu voto.

Acesso à moradia

Segundo a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), caso entre em vigor a regra que determina correção igual à da poupança, os juros dos financiamentos do FGTS, principal fonte de recursos para o programa  Minha Casa, Minha Vida (MCMV), por exemplo, teriam aumento de até três pontos percentuais.

De acordo com um levantamento da associação, a alteração nas regras impactaria diretamente 75% dos atuais beneficiários do programa, ou cerca de 13 milhões de famílias, que deixariam de ser elegíveis ao MCMV. “Para citar um exemplo, um imóvel de R$ 180 mil (valor médio do programa MCMV) pode ser financiado hoje por uma família com renda mensal de R$ 1.900. Caso mudem as regras, esse mesmo imóvel só poderá ser financiado por famílias com renda acima de R$ 4.200”, destacou a Abrainc, em nota. (Com Agência Estado)